sexta-feira, 15 de julho de 2016

França paga uma conta histórica

Paris, 2005, jovens árabes e africanos incendiaram periferia da cidade
Ainda sobre a França. Lamento a morte de civis inocentes. Porém impossível não enxergar que a França hoje paga a conta de décadas de violenta dominação no norte da África, parte do Oriente Médio e Ásia. A Argélia, maior território ocupado pelos franceses na África, só libertou-se do domínio em 1962 depois de uma violenta guerra. É pouco tempo para cicatrizar as feridas.

Os franceses – que no imaginário popular carregam a marca de intelectualizados, educados, refinados, democratas e defensores das liberdades civis – foram colonizadores sanguinários que até a década de 1960 perpetraram crimes violentos contra povos que dominaram. Torturaram, mataram, oprimiram, usurparam terras, proibiram a religião e reduziram direitos civis dos povos dominados tanto na África como na Ásia.

Ainda hoje oprimem as vítimas de seu colonialismo, afinal de contas argelinos, tunisianos, marroquinos, senegaleses e outros, vivem na França sob o signo da discriminação e tratados como cidadãos de segunda classe. Diante de tudo isso a conta “pendurada” pelos franceses ainda está longe de ser paga. E, por hora, tá saindo barata.

Mais um pouco de história 

Durante os 132 anos de ocupação da Argélia o governo francês impunha uma série de restrições ao povo local como: 30% das terras pertenciam a colonos franceses brancos, o idioma árabe e a religião muçulmana foram proibidas, livros em árabe foram proibidos, cidadãos argelinos que migravam para a França não tinham direitos políticos apesar de ter a cidadania e, ainda, muçulmanos não podiam ascender socialmente mesmo que vivessem nos territórios ocupados.

Africanos lutaram e morreram pela França na II Guerra
Durante a II Guerra Mundial 290 mil argelinos lutaram pelo exército francês. Muitos foram convocados, mas outros tantos se alistaram porque o governo francês prometeu libertar a Argélia após a guerra, mas não cumpriu a promessa. Os soldados da África do Norte não tinham os mesmos direitos - chocolate e frutas, por exemplo, eram distribuídos apenas aos combatentes europeus - mas morriam da mesma forma.

O exército francês adotou a tortura como arma de guerra tanto nas colônias da África como na Indochina e criou esquadrões da morte para “silenciar” civis opositores nos territórios ocupados.

Em 1961, 200 pessoas de origem árabe foram mortas pela polícia francesa durante uma manifestação em Paris.

Em 2005, jovens de origem árabe e africana enfrentaram a polícia em quase dez dias de confronto nos subúrbios de Paris reivindicando melhores condições de vida. O então ministro do Interior, Nicolas Sarkozy definiu os manifestantes como “canalhas” e determinou uma dura repressão. Nada mudou na periferia da cidade.

Para saber mais: 

Documentário: 

Esquadrões da Morte, a Escola Francesa – Marie Monique Robin, 2014

 
 
Filme: 
Dias de Glória (Indigénes)- (FRA, DZA, MAR, BEL, 2006), direção Rachid Bouchareb

Livro 
A Tortura como Arma de Guerra - Leneide Duarte-Plon, Editoria Civilização, 2016